Entenda a acusação de Moro, a defesa de Bolsonaro e o que as investigações mostraram até agora

O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), levantou nesta sexta-feira (22) o sigilo da reunião ministerial de 22 de abril que é uma das principais evidências do inquérito que investiga denúncias contra o presidente Jair Bolsonaro feitas pelo ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro.

Ao anunciar sua saída do governo, em 24 de abril, Moro disse que Bolsonaro tentou interferir politicamente no trabalho da Polícia Federal (PF) e em inquéritos relacionados a familiares.

O pedido de abertura do inquérito foi encaminhado pelo procurador-geral da República, Augusto Aras. Decano do STF, Celso de Mello foi sorteado relator do pedido e autorizou a abertura em 27 de abril – ele deve supervisionar e autorizar as diligências.

Um dos motivos alegados Moro para deixar o Ministério da Justiça foi a exoneração do ex-diretor-geral da PF Mauricio Valeixo, seu homem de confiança. Moro afirmou que Bolsonaro decidiu trocar a direção-geral da PF porque o presidente gostaria de ter acesso a informações de inquéritos sobre a própria família.

De acordo com o ex-ministro, Bolsonaro manifestou a intenção de interferir no comando da corporação em diversas ocasiões, inclusive na reunião ministerial de 22 de abril.

Em pronunciamento no mesmo dia em que Moro deixou o governo, Bolsonaro afirmou que as declarações do ex-ministro são infundadas e que não tentou interferir na PF.

Em 12 de maio, o presidente disse também que o vídeo da reunião de 22 de abril deveria ter sido destruído e que sua preocupação era com a segurança da família – e não com investigações. A afirmação não faz sentido, já que a segurança da família é feita pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI) – e não pelo Ministério da Justiça ou pela PF.

Inicialmente, o presidente também negou ter usado na reunião os termos “polícia federal”, “superintendência” e “investigação sobre os filhos”. Dias depois, no entanto, ele admitiu ter falado a palavra “PF” no encontro ministerial. Também ressaltou que se posicionou para interferir em assuntos de segurança física de sua família, e não em temas de inteligência e investigações dentro da corporação.

Quatro dias após Moro deixar o governo, Bolsonaro nomeou Alexandre Ramagem – atual diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e amigo da família do presidente – para o cargo de diretor-geral da PF. A nomeação, no entanto, foi suspensa pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF. Para Moraes, houve desvio de finalidade na nomeação.

Veja, abaixo, a cronologia e os principais pontos do inquérito:

  • 24 de abril (manhã): Sergio Moro se demite do cargo de Ministro da Justiça e diz que Jair Bolsonaro tentou interferir politicamente na PF ao demitir o então diretor-geral do órgão, Maurício Valeixo, e insistir na troca do comando da PF no Rio de Janeiro.
  • 24 de abril (tarde): Jair Bolsonaro faz pronunciamento cercado pela maioria de seus ministros e diz que Moro propôs aceitar demissão de diretor da PF se fosse indicado ministro do STF. O presidente nega interferência mas diz que pedia a Moro, e nunca obteve, um relatório diário das atividades da PF para poder tomar decisões de governo.
  • 24 de abril (noite): Jornal Nacional revela parte das mensagens trocadas entre o ex-ministro e a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) nas quais que ela tentava convencer Moro a permanecer no cargo.
  • 24 de abril: O Procurador-geral da República, Augusto Aras, solicita abertura de inquérito para apurar declarações de Moro.
  • 27 de abril: Celso de Mello autoriza inquérito no STF para apurar declarações de Moro com acusações contra Bolsonaro.
  • 28 de abril: Bolsonaro nomeia Alexandre Ramagem – atual diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e amigo da família do presidente – para o cargo de diretor-geral da PF.
  • 29 de abril: o ministro Alexandre de Moraes, do STF, decidiu no dia seguinte suspender a nomeação de Ramagem. Para Moraes, houve desvio de finalidade na nomeação.
  • 2 de maio: Sergio Moro presta depoimento de mais de 8 horas na sede da PF em Curitiba.
  • 4 de maio: Bolsonaro nomeia o delegado Rolando Alexandre de Souza como novo diretor-geral da PF.
  • 6 de maio: Celso de Mello determina que vídeo da reunião ministerial de 22 de abril seja entregue pelo governo em prazo de 72 horas.
  • 6 de maio: A Advogacia-Geral da União (AGU) vai ao STF para tentar rever decisão que mandou entregar vídeo de reunião citada por Moro.
  • 9 de maio: PGR pede acesso à integra do vídeo de reunião de 22 de abril.
  • 13 de maio: Governo confirma Carlos Henrique de Sousa, ex-superintendente da PF do RJ, como novo número 2 da PF.
  • 14 de maio: Divulgada a íntegra da troca de mensagens entre Moro e Zambelli; deputada diz a Moro que Bolsonaro “vai cair se o sr. sair”.
  • 14 de maio: AGU pede ao STF que libere somente as falas do presidente Jair Bolsonaro; a defesa de Moro alega que a petição omite trechos relevantes para a compreensão correta da fala do presidente, e reforça pedido para publicar vídeo na íntegra.
  • 15 de maio: Jair Bolsonaro admite, pela primeira vez, que citou a PF no vídeo da reunião ministerial e confirmou que a transcrição da Advocacia-Geral da União está correta.
  • 19 de maio: Celso de Mello assiste à íntegra do vídeo da reunião ministerial.
  • 24 de maio: Celso de Mello divulga o vídeo da reunião.

Significa que o ministro do STF Celso de Mello entendeu que há elementos nas declarações de Moro que justificam uma investigação prévia. Os dados levantados na investigação podem ou não levar à abertura de um processo, a depender do fato de a Justiça considerar as provas suficientes.

Enquanto não há um processo, ninguém pode ser considerado réu. Consequentemente, a abertura do inquérito não significa que a Justiça já considera alguém culpado.

O decano do STF argumentou que os fatos narrados por Moro “parecem” ter relação com o exercício do mandato do presidente, hipótese em que a Constituição permite a abertura de um inquérito.

Segundo Celso de Mello, os fatos narrados por Moro têm relação com o exercício do cargo de presidente, o que permite a investigação de Bolsonaro durante o mandato.

“Os crimes supostamente praticados pelo senhor presidente da República, conforme noticiado pelo então Ministro da Justiça e Segurança Pública, parecem guardar (…) íntima conexão com o exercício do mandato presidencial, além de manterem – em função do período em que teriam sido alegadamente praticados – relação de contemporaneidade com o desempenho atual das funções político-jurídicas inerentes à chefia do Poder Executivo”, escreveu o ministro.

Fonte: G1