O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, tentará destravar o pagamento dos dividendos extraordinários da companhia depositados em um fundo de remuneração dos acionistas por decisão do conselho de administração da estatal.
Segundo conselheiros e fontes do governo, há um momento de instabilidade inédito na petrolífera, onde estão de lados opostos Prates — e a diretoria escolhida por ele — e os outros cinco nomes escolhidos pelo governo Lula para compor o conselho da companhia.
Há um temor, por parte do conselho, que a instabilidade na relação entre o presidente escolhido por Lula e os conselheiros também escolhidos por ele e pelos seus ministros possam impactar em cinco debates e projetos estratégicos para 2024: as negociações sobre ações da Braskem, o investimento em gás, a transição energética, o novo planejamento estratégico e as negociações para a gestão da refinaria de Landulpho Alves, na Bahia.
Jean Paul Prates negou que haja rompimento entre ele e os conselheiros, e afirmou que divergências são naturais. Reconheceu, no entanto, o que chamou de ‘estresse’ na alta cúpula.
Prates entende que, por serem parceiros de trabalho, indicados separadamente e independentemente, não há motivos para se falar em “rompimento”.
A escalada da crise começou na última quinta-feira (7), quando a discussão sobre a distribuição de dividendos extraordinários (ou seja, não previstos inicialmente) opôs os representantes dos acionistas minoritários e do governo federal.
Fontes afirmaram que um estudo técnico mostrando que distribuir todos os dividendos imediatamente aos acionistas poderia causar risco de endividamento para a Petrobras.
Ainda assim, os representantes de bancos e pessoas que tem ações da estatal avaliaram que o risco era baixo e votaram pela distribuição de 100% do valor a acionistas.
Esse também era o plano de Prates que, ao ver os emissários do governo torcendo o nariz para a ideia, se absteve na votação. Unidos, os cinco conselheiros do governo, impuseram derrota a Prates e aos enviados do mercado, com a decisão por guardar metade do dinheiro em um fundo.
Representante dos trabalhadores no conselho, Rosângela Buzanelli aderiu à tese governista e foi o sexto voto a favor de não entregar os valores a acionistas, contrariando o plano de Prates que, tendo ele se recusado a votar, ficou com apenas quatro votos.
“Não voto contra esse ou aquele. Voto no melhor interesse da Petrobrás e os dividendos extraordinários não fazem parte de minhas aprovações desde que assumi o primeiro mandato”, disse Rosângela à .
O dia seguinte da decisão, sexta-feira, foi de intensas movimentações dos dois lados. Enquanto aliados do governo cantaram vitória, afirmando que a política de “raspar o tacho” da Petrobras havia finalmente acabado, aliados de Prates falavam em “sabotagem”, porque a retenção de dividendos ofuscaria os bons resultados da companhia mesmo sem vender ativos, o que gerou recordes de lucros em 2023.
Em meio à crise, veio a divergência entre Prates e os representantes do governo que, mantiveram interlocução com três ministros: Alexandre Silveira (Minas e Energia), Rui Costa (Casa Civil) e Fernando Haddad (Fazenda).
Posta a notícia da não distribuição de todos os dividendos, as ações ordinárias da Petrobras caíram 10,57% na sexta-feira (8/3).
Tudo acontece a sete semanas da Assembleia Geral da Petrobras, marcada para o dia 26 de abril. Nela, poderão ser trocados conselheiros. Uma lista enviada pelo Ministério de Minas e Energia em fevereiro mantém os nomes de Prates e dos outros cinco já ocupantes das cadeiras do governo. No entanto, fontes do governo federal reconheceram que ainda é possível a troca de nomes até a assembleia, embora não acreditem que isso seja, neste momento, provável.
O primeiro sintoma da relação estremecida veio no segundo semestre do ano passado. Interlocutores do governo afirmavam que o plano inicial de investimentos para a Petrobras estava orçado em US$ 80 bilhões e que o governo teria incluído três itens: os investimentos em parques de refino, na indústria do gás e na produção de fertilizantes, fazendo o montante de dinheiro investido até 2028 subir para US$ 102 bilhões. Prates nega que tenha havido alteração no plano.
Com a crise já imposta e a relação estremecida, Prates participou da reunião do conselho de quinta-feira por videoconferência, mesmo estando a metros da sala de reunião onde os conselheiros de reúnem, na sede da empresa, no centro do Rio de Janeiro. Ele afirma que é comum e corriqueiro participar das reuniões da sala dele, onde tem mais liberdade para receber assessores e despachar outros assuntos durante a reunião do conselho.
Representantes dos acionistas minoritários – em geral, bancos e fundos de investimento – temem uma maior intervenção do governo Lula (PT) nas políticas da estatal. Eles dizem, no entanto, que esse movimento também foi percebido na gestão dos indicados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
“Brasília parece não aceitar que a Petrobras tem acionistas, tem obrigação de dar lucro, tem uma nova governança pós-Lava Jato e já está investindo tudo o que consegue, não pode ser a qualquer custo”, disse um conselheiro dos minoritários.
Segundo informações o responsável por dar as diretrizes do governo aos conselheiros é o ministro Alexandre Silveira, de Minas e Energia. Procurado, ele não quis comentar o assunto.
A crise deflagrada no alto escalão tem incomodado os conselheiros, que se disseram pegos de surpresa com a divergência da última reunião. Rosângela defende que cada conselheiro quer o melhor pra companhia e nega que tenha votado em bloco com o governo.
“Acho que reduzir a posição do conselho a uma disputa política contra esse ou aquele é desrespeitoso para com seus membros, além de fazer um jogo que não interessa à Petrobrás nem ao Brasil, pode até atender interesses outros, com os quais eu não tenho compromisso”, disse à representante dos trabalhadores.
Fonte: CNN