Investidores do mercado financeiro reagiram mal à alternativa em avaliação pela equipe do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de retirar de forma permanente as despesas do programa de transferência de renda do teto de gastos, a regra que limita o crescimento das despesas à inflação. A medida é uma das opções na mesa para viabilizar o Auxílio Brasil (que deve voltar a se chamar Bolsa Família) de R$ 600 no ano que vem.
A preocupação se dá porque a alternativa vem ganhando força na equipe de transição nos últimos dias – que, há poucos dias, priorizava apenas criar o chamado “waiver”, uma licença para gastar, por meio da PEC da Transição. Nesta quarta-feira, 9, o deputado federal reeleito e líder do PT na Câmara, Reginaldo Lopes (MG), defendeu a retirada do programa social do teto de forma permanente. Na terça, o presidente da Comissão Mista de Orçamento, deputado Celso Sabino (União-PA), falou em “excepcionalizar” o programa da regra fiscal.
Para o mercado, a saída que vem sendo negociada pela equipe de transição, que também teria de ser feita via PEC, pode deteriorar a trajetória de sustentabilidade da dívida pública. “Tirar os programas sociais do teto, para mim, é a pior das possibilidades. Não que os programas sociais não sejam importantes, pelo contrário. São muito importantes e têm ganhado espaço no Orçamento. Mas, à medida que você tira uma classe de gastos do teto, ele passa a não ter referência para frente”, afirma Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos. “Sem regra, o gasto vai poder crescer sem precisar cortar de outro lugar. É uma alternativa que fragiliza muito a gestão da política fiscal para frente, a previsibilidade da política fiscal.”
A retirada do programa social do governo sempre foi um desejo do mundo político, sobretudo depois da pandemia da covid-19, quando a elevação das despesas do Auxílio Brasil comprimiram ainda mais o espaço orçamentário para outras políticas, pelas amarras do teto de gastos.
Excluir do teto os gastos de R$ 175 bilhões do programa abriria um espaço no Orçamento de 2023 para outras despesas, como o aumento do salário mínimo, em R$ 105 bilhões. A diferença se deve ao incremento do Bolsa Família com as promessas feitas por Lula na campanha, como a manutenção dos R$ 600 (R$ 52 bilhões) e R$ 150 para famílias com crianças de até seis anos (R$ 18 bilhões).
“Tirar esse gasto social do teto cria dois problemas: primeiro que você vai encher o teto com outras despesas; depois, o programa que sai do teto fica ilimitado daqui para frente”, diz Megale. “Quanto mais medidas você tira do teto, mais difícil vai ficando controlar as despesas e, portanto, controlar a dívida, que ao fim e ao cabo é onde nós estamos querendo chegar: uma previsibilidade da evolução do endividamento público brasileiro.”