Uma notícia inusitada vinda da China chamou a atenção nos últimos dias: autoridades locais anunciaram que iriam começar a usar o swab anal para diagnosticar a Covid-19.
Em resumo, o método consiste em introduzir no ânus uma haste flexível para colher amostras de material orgânico, que depois serão analisados em laboratório para detectar (ou não) a presença do coronavírus.
Atualmente, o padrão é fazer o swab nasal, em que a haste é colocada no nariz e na boca para coletar amostras lá do fundo da garganta.
De acordo com especialistas chineses, o novo exame teria uma precisão maior, traria resultados mais confiáveis e seria particularmente útil em algumas situações especiais.
Mas o que a ciência diz sobre o assunto? E como os testes que diagnosticam a Covid-19 evoluíram nos últimos meses?
Via alternativa
A ideia de fazer testes laboratoriais pelo ânus não é particularmente nova.
Exames de fezes e colonoscopia, por exemplo, são métodos valiosíssimos para o diagnóstico de uma série de doenças — de infecções gastrointestinais ao câncer colorretal.
Até mesmo no contexto da Covid-19 o assunto não é uma novidade absoluta.”Já sabemos há algum tempo que o intestino poderia funcionar como um santuário do coronavírus, como acontece com outras doenças virais. Ele poderia escapar do nariz e dos pulmões, ficaria em algumas regiões do sistema digestório e seria eliminado pelas fezes”, raciocina o infectologista Celso Granato, diretor clínico do Grupo Fleury.
Ainda nos primeiros meses de pandemia, os médicos notaram que a doença não se limitava aos sintomas respiratórios e muitos pacientes apresentavam incômodos gastrointestinais, como cólicas e diarreia.
Portanto, do ponto de vista das características da enfermidade, pensar num swab anal não é tão estranho assim — apesar de não existir nenhuma evidência contundente até o momento mostrando que ele seria superior ou traria resultados melhores do que a análise feita pelo nariz e pela garganta.
Barreiras naturais
Se os testes pelo ânus são aprovados na análise técnica, eles emperram em questões como comodidade, praticidade e conveniência.
“Há uma série de restrições de natureza cultural, de foro íntimo. Um exame desses envolve expor a própria genitália e a região anal, que são bastante sensíveis”, aponta o infectologista e epidemiologista Fernando Bellissimo Rodrigues, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP).
Na própria China, o swab anal será usado por enquanto em situações muito específicas.
Segundo uma reportagem da Forbes, testes desse tipo estão sendo aplicados em passageiros que desembarcam no aeroporto de Pequim e em alguns centros de quarentena.
Há notícias de que um grupo de mil crianças e professores também precisaram fazer o exame depois que foram expostos ao coronavírus.
Especialistas ouvidos pela BBC News Brasil apontam que o método também poderia ser válido em pacientes com diarreia como sintoma principal ou em pessoas que apresentam alguma dificuldade para a coleta pelo nariz e pela garganta.
Mas essa não é a única novidade no mundo do diagnóstico da Covid-19: nos últimos meses, o conhecimento e a tecnologia avançaram bastante e hoje trazem uma série de opções diferentes que facilitam a vida de pacientes e profissionais da saúde.
De forma geral, os exames para Covid-19 são divididos em dois grandes grupos: os testes virais e os de anticorpos.
O primeiro detecta o agente infeccioso (ou pedacinhos dele) e permite saber se a pessoa está com a doença “ativa” em seu organismo.
Já os testes de anticorpos medem a resposta do sistema imunológico e indicam se o indivíduo já teve a doença no passado — falaremos sobre eles em detalhes mais adiante.
De acordo com as principais diretrizes nacionais e internacionais, o método principal para diagnóstico do coronavírus continua a ser aquele conhecido pela sigla RT-PCR.
A coleta acontece por meio do swab nasal, em que a haste flexível raspa o fundo da garganta para colher o material que será analisado no laboratório.
“Sabemos que essa região costuma ter a maior concentração de vírus em infecções respiratórias e é relativamente fácil de acessar pelo nariz e pela boca”, explica o virologista José Eduardo Levi, da rede de laboratórios Dasa.
O RT-PCR é o exame que possui atualmente a melhor sensibilidade entre as opções disponíveis.
Isso significa que ele é capaz de identificar, entre as pessoas com suspeita de estarem infectadas, aquelas que realmente estão doentes.
Na prática, o método deixa “escapar” poucos casos de Covid-19, o que dá uma grande confiança em seus resultados.
Mas, apesar da alta confiabilidade, essa opção apresenta algumas desvantagens.
A primeira delas é a demora para obter os resultados.
O RT-PCR também requer equipamentos, reagentes e profissionais especializados, o que torna todo o processo mais custoso.
Por fim, não dá pra ignorar o fato de a coleta ser incômoda — quem já precisou fazer sabe que o swab nasal não é nada agradável.
Fonte: G1